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Fonte: http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2764386.xml&template=3898.dwt&edition=13827§ion=1015
Zero Hora, Porto Alegre, 31.12.2009 e 1.º.1.2010, N.º 16202
CRISE ANUNCIADA
Revisão da Anistia opõe Planalto e militares
Ao deixar aberto o caminho para alterar a Lei da Anistia depois de 30 anos, a proposta do Planalto que cria uma comissão para reabrir a investigação de crimes cometidos durante o regime militar gerou uma chaga entre o governo e os militares. Com a crise instalada – o ministro da Defesa, Nelson Jobim, chegou a pôr seu cargo à disposição –, Lula trabalha agora por conciliação.
A proposta que abre brecha para a revisão da Lei da Anistia, concebida em 1979 para viabilizar a redemocratização depois de 21 anos de regime militar (1964-1985), abriu uma crise no governo Lula – levando o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e autoridades militares a colocarem seus cargos à disposição.
A Lei da Anistia permitiu a volta de líderes políticos exilados ao país a partir de 1979 e encerrou a investigação de crimes, como assaltos e sequestros, cometidos pelos movimentos de esquerda no combate à ditadura. Como contrapeso, absolveu também excessos praticados pela repressão contra os militantes, incluindo casos de tortura e assassinatos.
A crise teve origem a partir da decisão do Planalto de lançar a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos. Um dos pontos da proposta, anunciada pelo governo em solenidade na semana passada, estabelece termos para a criação da Comissão Nacional da Verdade. Caberia a essa comissão esclarecer e tornar públicos os crimes cometidos no período.
Ao avaliar que o projeto tem caráter “revanchista”, os militares pressionam por um recuo do Planalto. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu governo, o primeiro encabeçado por um partido de esquerda desde o fim da ditadura, vive agora um dilema. Os principais ministros, incluindo a candidata do PT à sucessão em 2010, Dilma Rousseff, defendem a reabertura de investigações de abusos da repressão.
Embora civil – mas aliado dos militares que compõem sua pasta –, o ministro Jobim ficou isolado dentro do governo, o que o levou a colocar o cargo à disposição de Lula. Diante da pressão, a tendência é de que o Planalto esfrie o projeto. Lula não deve alterá-lo, mas também não vai se empenhar para que tramite no Congresso.
A tensão entre militares e a área de Direitos Humanos não é novidade no atual governo. Em 2007, foram duras as críticas de militares ao livro Direito à Memória e à Verdade. Mais complicada foi a reação dos militares ao debate defendido pelo Ministério da Justiça e fomentado pelo ministro Tarso Genro, sobre limites à impunidade de torturadores.
Proposta do governo divide opiniões
Na caserna, a avaliação é de que a proposta provocará reações nocivas ao país, passados 30 anos da anistia.
– Eu espero que o decreto seja revisto e seja reformulado no sentido de proporcionar uma pacificação da sociedade brasileira – defendeu o presidente do Clube Militar, general Gilberto Figueiredo.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que defende no Supremo Tribunal Federal (STF) ações reivindicando a abertura dos arquivos da ditadura e a punição de torturadores, elogia a proposta governista. O presidente da OAB, Cezar Britto, criticou a postura de Jobim.
– O Brasil não pode se acovardar e querer esconder a verdade. Anistia não é amnésia. É preciso conhecer a história para corrigir erros e ressaltar acertos.
No Congresso, o tema dividiu opiniões.
– Tenho um pé atrás com essa revisão da Lei da Anistia. É impensável rever ou extinguir a lei – afirmou o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional.
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A origem da polêmica
O QUE É
- Lançado no dia 21, a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos é uma espécie de guia para o governo federal com o objetivo de orientá-lo nas políticas de promoção dos direitos humanos no Brasil.
- O programa, que prevê ações a serem realizadas pelo governo e os órgãos responsáveis pela implementação, foi assinado por 31 ministérios, incluindo a Secretaria Especial dos Direitos Humanos, que elaborou o texto.
O TRECHO POLÊMICO
- O capítulo questionado pelos militares é o “Eixo Orientador VI: Direito à Memória e à Verdade”, que propõe a formação de grupo de trabalho para discutir a criação da Comissão da Verdade. Com mandato e prazo definidos, a comissão teria a função de esclarecer e tornar públicas as violações ocorridas no regime militar (1964-1985).
OUTRAS DIVERGÊNCIAS
- O programa determina a identificação e a sinalização de locais públicos que serviram à repressão ditatorial, bem como locais onde foram ocultados corpos e restos mortais de perseguidos políticos. Os militares imaginam que o resultado seja a depredação ou até a invasão de instalações militares.
- Outro item prevê um grupo de trabalho para discutir com o Congresso a revogação de leis do período do regime militar que sejam “contrárias à garantia dos direitos humanos ou tenham dado sustentação a graves violações”. A proposta é interpretada pelos militares como brecha para uma revisão da Lei da Anistia.
- Há uma proposta proibindo que logradouros e prédios públicos recebam nomes de pessoas que praticaram crimes contra a humanidade. Os militares não admitem a retirada de nomes de oficiais de avenidas pelo país afora. Em Brasília, há a Ponte Costa e Silva e o Ginásio Presidente Médici.
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